Um mosquito, o descaso e a dengue

Ivaldo Fernandes
J. Victtor

O Rio tem mata atlântica
Baía de Guanabara
Pão de Açúcar e Corcovado
Tem uma beleza rara
Mas paga com seu desleixo
Os olhos da própria cara.

As praias com línguas negras
E ladrões à luz do dia
Tráfico de entorpecentes
E o que há muito eu não lia:
“A cidade enfrenta hoje
Uma grande epidemia.”

A dengue e o Aedes
Aegyptis, o mosquito
Formam grande ameaça
Que agora aqui eu cito
E junto com todo mundo
De revolta solto um grito.

O ano é 2008
Nem é verão, é Outono
E ninguém quer autoria
Nem ser do mosquito o dono
Pois a picada é fatal
Levando ao eterno sono.

Na cidade é só alarde
prefeito e sanitarista
governador, deputado
tudo quanto é vigarista
mas o mosquito que é bom
eles perderam de vista.

Já rezaram a Jesus Cristo
Abraão, Alah e Buda,
Já prometeram trazer
Até médico de Cuba
Mas do governo, o desleixo
É a gente que entuba.

E se há epidemia
Ela é o resultado
Da falta de consciência
Do político safado
Que deixa a população
Sem esgoto encanado.

Se houvesse consciência
E também planejamento
Não estaríamos hoje
Passando este sofrimento
Enterrando criancinhas
Na flor do seu crescimento.

Esta grande epidemia
Foi há muito anunciada
Pois desde os anos 90
A dengue foi registrada
Mas depois que ela se ia
Ninguém fazia mais nada.

Para campanhas políticas
Temos verbas colossais
Publicidade de ponta
Com anúncios nos jornais
Programas de vários minutos
Passando em todos canais.

Os leitos dos hospitais
Estão todos ocupados
Pelos antigos doentes
Ainda não recuperados
E outros nos corredores
Por ali ficam deitados.

O rico não é picado
Pois se protege melhor
Não tem terreno baldio
Nem lixo ao seu redor
Se para o pobre era ruim
Agora ficou pior.

A população também
Joga lixo bem ao lado
Da própria casa que mora
Ficando tudo espalhado
E o mosquito agradece
Dizendo: muito obrigado.

O mosquito não tem culpa
Se vê a água parada
Pensa logo: é aqui
Que eu solto a rapaziada
A minha reprodução
Está sendo preparada.

“Sou apenas um mosquito
De sangue tenho apetência
Como bem e com fartura
E aproveito a incompetência
De quem me deixa viver
A minha boa existência.”

As agências de turismo
Aos gringos vão alertando
Cubram as suas canelas
Se estiverem passeando
Pois a picada não dói
Mas aos poucos vai matando.

Eu acho inacreditável
Não inventarem vacina
Que teremos que passar
Todo ano esta sina
Que o mosquito me picando
Lá vou eu pra oficina.

Com febre e dor de cabeça
Corpo mole e fraqueza
Se for a segunda vez
Vou pra cova com certeza
E o danado que eu nem vi
Vai ficar na redondeza.

Que este surto agora sirva
Pelo menos de lição
Para os seus responsáveis
Agirem com prevenção
Não deixando que tenhamos
Outra contaminação.

O fumacê vem nas ruas
A cada esquina que passa
O mosquito vai embora
Sente logo que é trapaça
É mais fácil eu morrer
Com o cheiro da fumaça.

Convocaram os militares
Pra acabar com esse mito
Botaram bala na agulha
Falaram igual periquito
E acertaram na mosca
Mas não acharam o mosquito.

Agora é questão de honra
Ir até o infinito
Não deixar água parada
Não dar chance a esse maldito
Se ele for ou não culpado
Eu mato cada mosquito.

A população precisa
Ter noção dos seus direitos
Pois esta epidemia
Existe pelos defeitos
De verbas mal aplicadas
Dos políticos eleitos.

O mosquito é pequeno
Mas tem picada profunda
E a população, coitada
Está numa barafunda
Pica a perna, pé e braço
E pica na nossa bunda.

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